No marco zero de toda cidade com mais de um milhão de habitantes tem um Paperwall.
Ele é feito do papel e seus parceiros. Papel de carta, papel de rascunho, papel de entrega, nota fiscal, papel de embrulhar carne, pão, peixe, papel jornal, papel-papel. Seus parceiros são o sangue, o verbo e a cola que mantém a estrutura firme.
Segundo as estatísticas, ele recebe mais de mil e quinhentas visitas por dia. As pessoas vão lá para reciclar seus sentimentos. Despejam sobre ele desamores, dores, rancores. Raramente despejam felicidade. Vão visitá-lo para obterem respostas e, quando isso não acontece, atiram pedras e choram nele. Algumas pedras conseguem transpassá-lo, tamanha a fúria do mundo. Apesar da vedação da cola, as lágrimas o incham e depois o encolhem, mudando sua estrutura.
Mas o Paperwall não se importa com as invasões na sua matéria. Até fica feliz, porque faz com que ele mude um pouco mais a cada dia. Os buracos são seus preferidos, pois faz com que as pessoas possam se ver e se reconhecer. Porque tanto a dor quanto o amor podem estar lá. Tudo se transforma. Quanto às lágrimas, ele diz que são necessárias. Está escrito em um dos jornais que o constitui, que lágrimas evitam a explosão interna de um ser humano – humano. Se você pensar bem, parece que tem um embasamento científico essa informação.
Hoje fui visitá-lo bem cedo. É impressionante o quanto de vida tem lá! Colei uma carta de amor do lado esquerdo e um desenho colorido do lado direito. Chorei um pouquinho, abri um buraquinho com uma agulha bem fininha e prometi voltar logo-logo pra contar as novidades.